quarta-feira, janeiro 22, 2003
London Connection
Por Fabio Amato
Nesta coluna para o London Burning, vou fazer algo que até aqui vem se mostrando complicado, pra dizer o mínimo: a defesa da música nacional.
Para realizar esta tarefa, me pautei na minha percepção do que deve ser o trabalho de um advogado. Sem essa de nacionalismo ou bater no peito em favor do produto nacional. Vou tentar aqui apenas fazer justiça.
Nunca fui fã de MPB. E das bandas de rock nacionais, foram poucas aquelas que me causaram, nos últimos 10 anos, uma boa impressão. Mas a cada ano que passa, o que vemos é que a música importada vem se tornando cada vez mais presente no Brasil, com as vendas de cds de bandas internacionais ocupando uma grande fatia do mercado. O interesse do público pela coisa gringa também transparece na mídia, onde o espaço para grupos ou movimentos/tendências até pouco tempo de acesso restrito a um pequeno e seleto público no País, como o chamado rock alternativo ou as vertentes eletrônicas, cresce a cada edição.
Sempre defendi a tese de que a música é algo universal, sem pátria, fronteiras ou preconceitos. Mais uma vez vale ressaltar que não se trata de propagar aqui uma mensagem ufanista. Acontece que, nos últimos anos, temos tido mais acesso a informações sobre o cenário internacional do que a respeito dos sons produzidos em nosso próprio País. Então resolvi tentar encontrar uma resposta para esse distanciamento.
E a resposta – pelo menos o argumento que achei mais coerente –veio em uma matéria publicada na Folha de S. Paulo, nos primeiros dias deste ensolarado janeiro, apontando que o investimento das gravadoras nacionais em novos artistas no ano passado foi praticamente nulo. Traduzindo: o cenário musical tupiniquim vive, há muitos anos, um grande marasmo; está nas cinzas esperando um milagre que a faça renascer, virar fênix.
Conforme aponta a reportagem, dos 10 álbuns mais vendidos em 2002, nas Cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, apenas 3 e 4, respectivamente, eram discos com faixas que poderiam ser consideradas inéditas. O primeiro lugar, em ambos os locais, ficou com o disco ao vivo, sem gravações inéditas, dos pagodeiros do Revelação.
A matéria aponta ainda que grande parte dos investimentos dos principais selos no ano anterior foi canalizado nas reedições. Algumas teriam canalizado até 50% da receita do ano com as reedições, um verdadeiro absurdo.
Outro dado de destaque é que as revelações de 2002 foram os cds de Kely Key, que, aliás, foi lançado em 2001, e teria conseguido 350 mil compradores; do quinteto desce-quadrado Rouge, aposta do SBT, que teria despachado quase um milhão de cópias (!?); e Maria Rita Mariano, filha de Elis Regina da qual eu nunca tinha ouvido falar até então, e que, pasmem, não tem disco gravado, só fez participação no de Milton Nacimento.
A música brasileira, ou o mercado fonográfico do País mais precisamente, usa uma tática no mínimo estranha, na contramão de tudo o que vem sendo feito em outros países, para conseguir vender discos. Não investe em novos talentos. Prefere, ano após ano, continuar abarrotando as lojas com aquelas coleções tipo “O melhor de...” e coletâneas de artistas manjados, que só vivem do nome e do sucesso no passado. Ou então – e ainda pior talvez – investem em bandas como Catedral, que imita descaradamente (e horripilantemente) o Legião Urbana, ou então neste tal Jorge Versilo, plágio do Djavan, naquela tentativa de continuar a fórmula que deu certo no passado.
Cobram um preço absurdo pelos cds e, ao final do ano, como tudo ficou encalhado e não compensa vender por preços populares devido aos impostos, recolhem tudo e passam um rolo-compressor em cima. Mas no outro ano, fazem tudo outra vez.
Incompetentes, dizem que os culpados pela falta de investimentos são a pirataria e a recessão geral. Não conseguem perceber que quem aponta um dedo, tem os outros três em sua direção.
Disse no início do texto que iria fazer aqui a defesa da música nacional, não dos gêneros, mas enquanto instituição. Tudo o que foi dito até agora prova que o Brasil tem música ruim porque está sendo asfixiado pelos “cartolas” do ramo, que não querem e dificultam ao máximo a renovação da cena, o que parece ser o motivo principal para abertura e interesse nacional cada vez maior pelo produto estrangeiro.